Bione - Cinisterium


CONTO 2 - O lugar dos vivos e dos mortos

“Quantos boatos uma cidade pode ter? O quanto essas histórias podem moldar a vida dos habitantes? E se uma única ação gerasse um terror tão grande que toda uma cultura foi mudada?"

Já havia se passado muito tempo desde que tal situação arrasou aquelas terras. Nunca tinha existido um acidente tão avassalador e infeliz na vida dos humildes eilins que se mudaram para Bione em busca de um espaço para chamar de lar, como aquele. Para sempre a altura das chamas, suas cores escarlates que crepitavam sobre as construções e entre as ruas, o horrível sufocamento da fumaça que adentravam nos pulmões a força e o repulsivo cheiro de carne queimada, ficaria marcado na memória e na história daqueles que ali viveram, vivem e viverão.

Ninguém nunca soube o que causou aquela insanidade, se foi algo que saiu errado, se Taren, o responsável, foi interpretado erroneamente, se o seu império de tecnologia rúnicas afetou sua mente ou se… Segundo a alguns rumores, algo ou alguém deu o último empurrão para que caísse em desgraça. No fim, nunca saberemos.

Entretanto… Conversas circulam, desconfianças aumentam as paranoias, os medos se tornam palpáveis e para essa cidade em que estamos, que quase foi reduzida ao pó, não foi diferente. Depois que os habitantes limparam os destroços e se reergueram, quase tudo que envolvesse fogo foi banido de Bione, e assim, o costume cultural de queimar os falecidos e jogar suas cinzas ao mar foi perdido.

Mas… Para onde iam os corpos então? É a partir daqui que os boatos ficam estranhos… Os corpos dos eilins que faleceram dali em diante começaram a serem enterrados em caixas retangulares, as vezes de madeira, as vezes de cimento, o material não importava muito, apenas o fato de enterrar o corpo selado. Porém o desconforto apenas cresceu, os velhos diziam que viam vultos, crianças escutavam vozes e adultos não andavam mais a noite quando a neblina ficava espessa. O novo costume era um absurdo para qualquer outra região eliziana, todavia para Bione que mudou drasticamente sua forma de viver, era algo que precisava ser tolerado e normalizado.

E foi dessa maneira que um dia, tendo estranhamente a solução para todos os problemas, um inusual eilin comum que simplesmente “estava” na cidade, todos o conheciam, mas ninguém parecia saber desde quando, sugeriu derrubar a mansão de Taren e transformar toda a área em algo nomeado Cemitério, lá e apenas lá, os corpos começaram a serem armazenados, e dessa vez, enterrados sempre com uma runa em sua boca. Durante tal feito, uma nova profissão até surgiu, o “coveiro”, que inicialmente era ocupada apenas por esse comum que morou naquelas terras por anos, sempre em silêncio, recluso e observador. A cidade parecia ter finalmente conhecido a paz e isso durou décadas até o comum, já bem velho, desaparecer no dia 31.

As vozes mais antigas contam que foi um caos, as pessoas voltaram a se assustar e imaginar espíritos, juravam de joelhos que algo os perseguia a noite caso chegassem muito perto da antiga mansão e o desespero durou por dois a três dias, quando um novo eilin surgiu, coincidentemente ou não, da mesma raridade, e se voluntariou para ser o novo coveiro, assumindo seu papel no dia 2.

Desde então, o Cemitério se tornou um lugar a ser evitado, "Não abusem o descanso dos mortos" diziam, "Apenas o Coveiro pode ficar lá" afirmavam e assim, a área da antiga mansão ficou afastada da cidade, um lugar de respeito, mas também de medo, um espaço em que o limite da vida e da morte parecem se encontrar… Talvez um espaço para também dar descanso a aquele que se jogou no mar… No fim, ninguém sabe a resposta, mas se eu fosse você, tomaria cuidado ao passar por perto, talvez não seja tão falso assim, que alguns esqueletos e vozes passeiam em volta da região na noite de halloweilin.